Santa
Maria/RS, 27 de janeiro de 2013. Ninguém irá se esquecer dessa data tão cedo!
Quer dizer... é o que se espera! Mais de 230 mortes desnecessárias e
perfeitamente evitáveis. Mas... por que aconteceram?
Sabem
que, apesar de comovido, eu não havia pensado no assunto a fundo ainda. Mas
hoje, vendo minha esposa chorar, percebi o quanto somos acomodados e alienados.
Em seu desabafo, pura denúncia profética: “Todo
mundo crucificando o gurizinho (sim, ele também é um jovenzinho) que iniciou o incêndio, mas ninguém fica
revoltado com o funcionário público preguiçoso
ou corrupto (e, aqui, não estamos falando de todos, mas de uma parcela que,
de fato, o é) que faz vistas grossas para
o alvará vencido, ou assina uma licença sem saber o que, de fato, está
assinando! Ninguém se lembra do bombeiro que não interditou um lugar sem as
mínimas condições de segurança! Cambada de hipócrita! São muito mais culpados
do que os músicos, que, no fim das contas, queriam só divertir a turma”.
Ouvi
tudo calado. Não chorei, mas devo ter corado de vergonha. Até então, tudo o que
eu tinha lido/ouvido a respeito se limitava a cartinhas de solidariedade,
reflexões sobre o que a morte e a dor teriam a nos ensinar, além de análises
muito supérfluas, sempre buscando culpados entre os que estavam na boate
naquela noite. O que mais me irritou foi um texto falando que Deus quis fazer
uma festa(?) no Céu e, por isso, levou a gurizada, deixando-nos na saudade.
Ora, a quem poderia servir esse tipo de pensamento? Foi Vontade de Deus,
então!? Mas que bando de covardes somos nós! Enquanto culpamos Deus, os
verdadeiros responsáveis continuam decidindo nossas vidas.
Meu
Deus, que ótima oportunidade de sermos profetas de verdade! Ok, as cartinhas de
solidariedade são legais, demonstram nosso interesse (ou o tamanho dele, pelo
menos)... Mas cadê a coragem de denunciar todo um sistema responsável pelo
extermínio de jovens? Esses morreram asfixiados ou queimados, mas quantos
morrem lentamente, com “pílulas coloridas” amplamente distribuídas nas raves? Quantos morrem lentamente, todos
os dias, embaixo de um viaduto, aparentemente invisíveis? Esses mesmos, que
morreram em Santa Maria, teriam sido vítimas de um suborninho aqui, uma
propininha ali, essas coisas que “agilizam” a liberação das atividades de um
estabelecimento? Cadê a coragem profética de denunciar essas práticas que só
visam o lucro? E não estou falando dos seguranças, que fecharam as portas com
medo da gurizada sair sem pagar o ingresso. Mais gananciosos são os membros do
cartel do entretenimento, para os quais não importam as pessoas, mas o que elas
estão dispostas a pagar por diversão. Esses criam necessidades, determinam o
que realmente é divertido, não nos dando a chance de decidirmos o que realmente
queremos. Mais uma vez... são outros os que decidem por nós. Até quando?
Não
chora, meu amor! Ou melhor, se vai chorar, saiba que estou aqui, solidário ao
seu sofrimento. Agradeço por abrir meus olhos. Se ninguém mais quiser denunciar
as maldades dessa sociedade corrupta e hipócrita, falemos nós! Um dia, alguém
nos escutará!
Eu escutei. Sua denúncia não será em vão.
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