quarta-feira, 6 de abril de 2011

Ecologia se aprende em casa

Mesmo negando a necessidade de Deus, a sociedade atual não conseguiu se livrar de suas culpas e do peso do pecado. Catástrofes como a do Rio de Janeiro e a do Japão tornaram inevitável o seguinte questionamento: estaria o Deus (que esta mesma sociedade declarou não existir) zangado? É natural esta indagação, uma vez que já nos primeiros capítulos da Bíblia vemos a queda como consequência da desobediência. Por outro lado, principalmente nos Evangelhos, vemos um Pai que acolhe, perdoa, restaura, “esquece” a ingratidão do filho pródigo num abraço... Poderia este Ser, que passou de punitivo a amoroso, voltar a ser vingativo conosco hoje?

Não que o senso comum esteja sempre certo, mas numa coisa ele tem razão: o que move o mundo não são as respostas, mas as perguntas. Mesmo com tantos avanços científicos em nossos dias, temos inúmeras questões existenciais. De onde viemos, para onde vamos, o que devemos fazer no breve intervalo entre uma coisa e outra? O que dizer, então, do povo há quase 3000 anos? Por que o parto, início de uma nova vida, causa tanta dor? E o trabalho, fonte do nosso sustento, por que exige tantos sacrifícios? Os primeiros capítulos de Gênesis procuram responder a essas e outras dúvidas, não demonstrando como surgiram os dilemas, mas o porquê.

Salvo interpretações mais conservadoras, hoje já sabemos que os contos bíblicos não são necessariamente fatos históricos. Como explicar, por exemplo, que em Gn 6,19 entrou um casal de cada espécie na Arca de Noé, enquanto Gn 7,2 conta sete casais de animais puros? Antes da criação, tudo estava tomado pelas águas (Gn 1,1) ou era deserto (Gn 2,4b)? Essas e outras perguntas geram sérios problemas para leituras “ao-pé-da-letra” (fundamentalistas). Por isso, a preocupação atual não é tanto saber o que aconteceu, mas o que Deus quer nos falar e, por outro lado, de que forma as autoras e autores bíblicos entenderam e retransmitiram esta mensagem.

Este novo modo de olhar nos leva a rever algumas “verdades” bíblicas. A primeira delas é a afirmação de que Deus era punidor, tornou-se Pai amoroso e voltou a ser vingativo nos dias atuais. Como pode um Ser, que já é perfeito, evoluir ou mudar? Talvez seja o nosso olhar que mude. Isso explicaria como o Javé dos Exércitos, guerreiro à frente das batalhas dos israelitas, tornou-se o Paizinho Querido de Jesus. Portanto, crer num Deus vingativo, hoje, seria um retrocesso, um descaso com os ensinamentos de Cristo.

Na época em que foi redigido o relato do Pecado Original (Gn 3,1-19), o povo tinha, de fato, uma visão diferente do Sagrado. Por volta do século VIII a.C., sob o reinado de Salomão, acreditava-se que Javé era autor tanto do bem quanto do mal. A ideia de um ou mais espíritos malignos surgiu tempos depois, no período do pós-Exílio babilônico. Para os israelitas, Deus era bom, mas também justo. Logo, as dores de parto e a fadiga do trabalho, vistas como “mal necessário”, só podiam ser consequência de culpa humana. E como os líderes religiosos não nutriam muita simpatia pelas esposas estrangeiras de Salomão (e não eram loucos de criticar abertamente o rei), por que não criar um mito usando a serpente (símbolo dos deuses estrangeiros), que seduz a mulher (esposas), que seduz o marido (Salomão)? A severidade do castigo é, então, justificada pelo pecado grave da idolatria, isto é, da adoração a outros deuses. Ainda hoje, há quem considere justo isso. Mas não é esta a imagem do divino retratada pelos evangelhos.

Vamos encontrar, em Jo 20,1-18, uma recriação do Éden. Durante a madrugada, Madalena vai ver o Mestre sepultado, mas encontra o túmulo vazio. Pedro e o outro discípulo encontram a mesma cena. Porém, enquanto estes voltam para suas casas, a mulher continua a procura. Olhando, então, para o lado oposto ao do sepulcro (qual o lado oposto ao da morte, senão o da vida?), encontra um jardineiro. Se Eva inicia um processo de afastamento e esquecimento de Deus, Maria Madalena faz o caminho inverso. Primeiro ela vê apenas o Zelador do Jardim, como se estivesse olhando para alguém distante. Depois, como se chegasse mais perto, ela re-conhece o Criador (afinal, quem vê Jesus, vê o Pai). A partir dessa experiência com o divino, ela não sente mais medo (já não é mais de madrugada) e sai a recriar o mundo, isto é, vai correndo anunciar: “Eu vi o Cristo”.

Curioso que os Apóstolos não tenham dado crédito a esta mulher. Os homens passaram anos (alguns fazem isso até hoje) acusando as mulheres de serem perigosas, sedutoras, porta de entrada do pecado. Mas conseguiram bravamente resistir à sedução quando estas portavam a Boa Nova. Foi necessário o próprio Cristo ressuscitado aparecer entre eles para que agissem. Sim, porque a verdadeira experiência de Deus nos leva a agir. O discípulo amado acreditou, ao ver o túmulo vazio, mas limitou-se a seguir Pedro. Criticamos o Apóstolo incrédulo, mas somos todas e todos meio “São Tomé”.

Está na moda falar em Ecologia. Pensar a criação é pensar ecologicamente. O ser humano é convidado a contemplar o rosto de Deus em suas criaturas, tendo a responsabilidade de zelar pela saúde do nosso planeta. Ações simples, como não jogar papel de bala no chão, ajudam a preservar o meio ambiente. Reciclar, reaproveitar e reutilizar são as palavras de ordem. É preciso mudar de uma relação de exploração para uma postura de cuidado mesmo com a Mãe-Terra. Infelizmente, muitas medidas são tomadas somente quando a situação já está crítica. Por isso, na maioria das vezes, só resta remediar. Mas, então, o que fazer para mudar esse quadro? Comecemos olhando para os lados. A forma como tratamos as outras pessoas reflete que tipo de relação temos com o restante da natureza.

“Quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê” (1 Jo 4,20). Ora, é impossível amar o Criador e não amar sua Obra. Amar é conhecer. Há quem pense que a natureza se resume a animais, rios e florestas. Homens e mulheres, porém, são o ápice da criação (Gn 1,27). Se os homens, desde há muito tempo, subjugam as mulheres, o que podemos esperar que façam com o planeta? Se os brancos escravizam índios e negros, não é de se estranhar que coloquem animais em gaiolas. Se os adultos menosprezam a capacidade produtiva e intelectual de jovens e idosos, o que podemos esperar que aprendam com os astros? Se as pessoas guerreiam por causa de sua religião, como esperar que respeitem animais, plantas, rios e até mesmo o ar que respiram? Se os ricos assim se fizeram explorando os pobres, por que não veriam a natureza como uma grande oportunidade de negócio? Quando o planeta, doente, reage, ficamos assustadas e assustados, e dizemos que é a “ira divina”. Mas a verdade é que, se queremos um novo Céu e uma nova Terra, devemos começar por novas relações interpessoais, baseadas não mais na exploração, mas no amor.

 
José Luiz Possato Jr

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